sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Viva la Vida or Death and All His Friends

Às vésperas de dar um importante passo, você percebe o caos ao seu redor. Várias armadilhas para te fazer retroceder, como num jogo de computador. Parabéns, essa é a vida. Ou: se fudeu, você nasceu!

Esse é o lugar onde o telefone não toca e quando toca nunca é quem você gostaria que estivesse chamando. Esse é o lugar onde o relógio corre muito depressa quando você precisa de tempo e muito devagar quando a espera é a única solução.

Aqui jaz um problema.

Não tá fácil para ninguém, mas se é com você é óbvio que é pior. Há uns seis anos, eu vejo pessoas que eu gosto morrer. Em um amontoado, que até parece de guerra. Mal dá tempo de viver um luto porque o trabalho chama. Muitas vezes se acaba por pular etapas.

Contemplar é proibido. Mas, como boa rebelde, eu contemplo. Quase sempre me assombro, principalmente com o que deixei passar.

Não sou vítima nem algoz, só quero viver da melhor maneira possível e - juro que aprendi isso com a minha própria experiência, não veio do berço - muitas vezes, para ser feli, é preciso passar por cima dos outros. Não me interpretem mal, não é preciso roubar, nem ferir, nem matar mas dois corpos simplesmente não ocupam o mesmo lugar ao sol no mesmo espaço de tempo. Sempre vai haver um perdedor e um vencedor. Tenho vivido há mais de três décadas com o primeiro título em muitas categorias e não estou muito confortável nessa roupa.

É bom lembrar que, pra todo mundo, há uma sombrinha virada pelo vento, uma descarga que não faz a merda descer, um ônibus que não espera, uma chaleira que ferve antes da hora, uma sinaleira que não abre.

Mas também há champagne, Häagen-Dazs, dias azuis, abraços bem-vindos, borboletas na barriga, amores de verão, cheiro de grama molhada, mar lambendo a areia.

Eu tenho um pouco de tudo isso e quero menos da parte das sombrinhas viradas, sem ter que me sentir culpada. Por que eu me sentiria? Segundo Nelson Rodrigues, é o complexo de culpa que nos salva de andarmos de quatro e ficarmos amarrados ao pé da mesa, alimentados em uma lata de Queijo Palmira.

Ao contrário da constataçãode que, às vezes, é preciso passar por cima dos outros para ganhar um lugar ao sol, o complexo de culpa em mim é inato. É ele que azeda o champagne, derrete o Häagen-Dazs, nubla os dias azuis, entre outras coisas.

Há uma relação conflituosa: deve-se esconder a culpa dentro do armário, cagar para os outros, rasgar os vestidos de luto e correr para a praia, ou deve-se sofrer mais que a Maria do Bairro e ganhar uma medalha e uma bonita coroa de orquídeas no final?

Meu amigo, essa angústia não é só minha. E eu não me culpo de dividí-la com você. Em algum lugar, há alguém, um fato, uma partícula que faz, fez ou fará tudo para que você se sinta muito, mas muito culpado e sozinho e reles e pústula e escória.

Talvez, você saiba lidar com isso de maneira mais prática do que eu. Ou talvez, você seja apenas egoísta - segundo as minhas últimas auto-estatísticas, não há ninguém no mundo mais egoísta do que eu, então, esse não deve ser o seu caso.

11 comentários:

Gin & Rum disse...

Saudações conterrânea...

Um lugar ao sol...
A briga por um lugar ao sol é talvez a maior metáfora do mundo egoísta em que nos encontramos.

Quem melhor que Veríssimo descreveu a eterna luta por um lugar ao sol?
Se dois animais podem disputar de modo ferrenho uma fresta de sol em um dia frio, até onde nós, seres humanos, somos capazes de ir por um verdadeiro "lugar ao sol"?

Sim. Muitas vezes o feixe de luz é pequeno demais para abrigar duas pessoas... nesse caso um pouco de egoísmo parecee justificável... mas e a culpa? Não será a culpa uma espécie de egoísmo também?? Um egoísmo que damo-nos o direito após uma atitude individualista? Não estamos pensando basicamente em nós mesmos ao sofrermos com o sentimento de culpa??

Talvez eu esteja divagando.
Talvez seja o segundo mais egoísta, depois de você.
Mas isso é papo para outra ocasião... em um bar... seja no meu, seja em um daqueles localizados na boemia da nossa cidade.

Um drink. Por minha conta... pelo menos o primeiro.

Rum.

Vica disse...

Adorei esse post. Mas meu complexo de culpa anda bem domado depois que comecei a ligar o foda-se com mais freqüência. Porque chega de azia.

Guiga disse...

Bia, apesar do pessimismo (ou realismo...), tá lindo teu texto!
Mas não deixa derreter o Häagen-Dazs, não! Always look to the bright side of life!
http://www.youtube.com/watch?v=jHPOzQzk9Qo

Sabe qual a tua cura?

EUROPA

Mas já te aviso que depois tu vais sofrer de "Depressão Pós-Europa"! Hehehehe! Aí vai ser outro post!

Anônimo disse...

WOW!!! GIRL FIGHT!!!!
BIA vs. BIA

Nesse confronto Bia x Bia você tem que entender o seguinte:
A Bia que você teme confrontar é uma pessoa má?? Não.
Essa Bia é egoísta?? Não.
Ela merece e tem que lutar por um lugar ao sol?? Sim.
Ok, então você não tem que temer a si mesma.

Toda essa neura sua é por não saber lidar direito com a separação que existe entre dolo e culpa.
Uma coisa é passar por cima dos outros, outra beeeem diferente é fazer aquilo que tem que ser feito. E vamos ser francos, você está a anos-luz de parecer ou vir a ser uma megera caso vc de aquele precioso passo que lhe falta para sair desse estado de "letargia".
E não, você não deve temer a culpa e também não precisa carregá-la por aí como se fosse uma cruz escondida no bolso. Sabe o lado bom de ser uma pessoa bem humorada que nem vc é?? É que fica muito mais fácil e divertido vc se policiar sem surtar, conseguindo manter os pés na realidade, não correndo o risco de virar um clone de Dr. Jekyll & Mr. Hyde.
Bom, é isso aí, o diagnóstico você mesma já fez. Agora falta você desviar das min... cascas de banana que vc coloca no caminho e se juntar a Bia do champagne, Häagen-Dazs, dias azuis, abraços bem-vindos, borboletas na barriga, amores de verão, cheiro de grama molhada, mar lambendo a areia.

Bia, sem querer ser rude mas sendo, o seu problema é que você pensa demais.
E como dizia Rimbaud: Por delicadeza, Perdi a minha vida.

Sai dessa.

N

Bia disse...

Casa comigo, Newman. Tá, agora ele sai correndo.

Anônimo disse...

Fui...

Luanna Figliolino disse...

sou mais essa opção

"deve-se esconder a culpa dentro do armário, cagar para os outros, rasgar os vestidos de luto e correr para a praia"

:)

Anônimo disse...

Bia, se o teu problema é pensar demais, pelo menos tu tem a coragem de botar pra fora.. e isso já é bem mais que meio caminho andado! Quem sabe um dia eu não aprendo a ser que nem tu, queria ter a capacidade de organizar meus sentimentos e pensamentos em textos lindos.. Saudade de ti! Bj!

Anônimo disse...

Não acho q pra conseguir as coisas q vc falou seja necessário passsar por cima dos outros.
Simplismente lute pelo o que é seu, mas não interfira no caminho do outro. O caminho mais fácil, quase sempre não é o melhor caminho... e passar por cima dos outros é tentar encurtar um caminho q vc tem trilhar sozinho.

Pense um pouco nisso.
=)

Anônimo disse...

Ahh,, Parabéns vc escreve muito bem.
=D

Alemao de Oculos disse...

É Literatura. Isso, maiúscula. Parabéns.